Thursday, October 1, 2009

A morte do livro

 

Quando, nos idos de 1998, entrei para a universidade, meu sonho era ter uma biblioteca de, no mínimo, 5000 títulos. Hoje, meu sonho é me desfazer de, pelo menos, 90% dos livros que tenho. O que mudou desde então?

Em 1998, ano em que o Brasil acabara de vender-se à Nike entregar o título da Copa do Mundo à França, os ânimos tupiniquins não estavam lá nas alturas. Yo, no entanto, aproveitava os intervalos entre os jogos (em que raramente havia aula ou atividade de pesquisa na faculdade (sim, no Brasil, 22 milhonários correndo atrás de uma bola de R$ 200,00 são mais importantes que uma aula de latim) para frequentar assiduamente a livraria Leonardo da Vinci, no ed. Marquês do Herval, no Centro do Rio. Lá, paulatinamente fui apresentado às literaturas inglesa e norteamericana, e posteriormente também à alemã.

Cada livro adquirido era um pedaço de sonho realizado, o próprio cheiro dos acabamentos das edições me inebriavam, aos poucos percebi que o mal já estava inoculado – havia me tornado um bibliófilo.

Comprei The Grammar Book, os grandes dicionários (incluindo uma versão em dois volumes de 5000 páginas do Webster’s Unabridged, The Oxford Encyclopedia of Languages, The Oxford Encyclopedia of the English Languages, obras completas de Shakespeare, Dickens, Goethe, Schiller, Nietzsche, compêndios de filosofia, história, religiões, entre centenas de outros. Num breve período áureo, chegava a comprar pelo menos 2 ou 3 livros por semana. Um dos eventos mais ansiosamente aguardados era a Bienal do Livro, de onde sempre saía com algumas dezenas de exemplares.

Em casa, persuadi meus pais a se livrarem de boa parte de sua biblioteca anterior para ocupar as prateleiras com os meus livros. De onde vinha o dinheiro? Consequência da, sem dúvida, melhor época financeira da vida de um jovem – do período em que você trabalha, ganha seu dinheiro, mas vive ainda com seus pais – 100% de ativos e 0% de passivos, quer seja, meus salários bruto e líquido eram absolutamente iguais. Não havendo namorada para estorqui-lo com passeios, shopping e jantares, o dinheiro pode ser dedicado quase totalmente à sua educação.

Foi uma época importantíssima, boa parte da cultura que adquiri advém desses 2 ou 3 anos de bibliofilia. Outra boa parte é fruto das viagens que tive o prazer e a oportunidade de fazer. O fato é que, ainda com Windows 95 e, posteriormente, 98, pouco acesso à Internet, poucos recursos online, não poderia me imaginar sem a biblioteca em construção que tanto prezava.

Tudo começou a mudar no verão de 2001. Naqueles meses de aulas forçadas por greves periódicas (que, nas universidades públicas brasileiras, são, via de regra, como ciclos menstruais, podem atrasar um pouco, mas sempre vêm), adquiri meu primeiro computador diferente de um tenebroso IBM (daqueles que só admitem hardware próprio) e consegui finalmente convencer minha mãe a assinar um plano de internet em banda larga.

O mundo mudou para mim depois que conheci recursos como o Projeto Gutenberg, o Grade Savers, dentre tantos outros. Percebia, já naquela época, que o conhecimento do futuro estaria fora das páginas impressas.

Comecei a me interessar mais por tecnologia, virei um geek assumido, saí gastando tudo o que podia e o que não podia com aparelhos e acessórios para o computador (acho que quase todo pré/pós-adolescente do séc. XXI passará por essa fase). Comecei a explorar recursos de comunicação como o saudoso ICQ, o MSN e, posteriormente, o Orkut.

Dos meus muitos hobbies, quase todos foram começados ou desenvolvidos por conta de contatos ou recursos oferecidos pelo Orkut. Através do Orkut, conheci colegas de profissão e estabeleci contatos profissionais e comerciais. Através do MSN e do Skype, falo sem custos com meus clientes e colegas. A disseminação do e-mail permitiu contato permanente entre professor e alunos. Em 1998, quando fiz meu primeiro e-mail, apenas 2 de meus 20 alunos também tinham um endereço.

O livro, com a Internet, passou a não precisar mais de livrarias físicas. Já em 2001, sem muito tempo para me deslocar ao Centro da cidade, fazia boa parte de minhas compras na Leonardo da Vinci pelo site, com entrega quase gratuita em casa.

Descobri a Amazon.com, a Livraria Cultura e a Livraria Saraiva, portais online em que podia comprar livros, e ainda CDs, DVDs e software. Não havia mais muitos motivos para gastar praticamente uma tarde para visitar a livraria.

Em 1998, íamos à livraria para ver os lançamentos, perguntar preços, folhear os livros. As Bienais eram a assembleia de cúpula dos bibliófilos. Nelas trocávamos informações, ficávamos sabendo das novidades editoriais e tínhamos acesso a livros importados que não conseguíamos encontrar em nenhum outro lugar.

Este ano (2009), fui pela enésima vez à Bienal do Livro, e provavelmente nunca mais vou voltar. Os preços nos sites das livrarias são iguais ou, por vezes, menores que os preços oferecidos nos stands, o marketing é baseado nos best-sellers, mais fortes e lidos que nunca; os convidados, antes pessoas da estirpe de Affonso Romano, Veríssimo e Suassuna, foram substituídos por um cover de Michael Jackson, pelo Hulk e por Meg Cabot. Quando às novidades? Dois segundos depois de impressos, os livros aparecem em monstruosos banners nos sites das editoras ou são disseminados em listas de spam.

Enfrentei engarrafamento, percorri 57 Km, enfrentei filas como de gás na época da inflação, não pude entrar em todos os stands por conta das assembleias midiáticas em frente aos mesmos regadas a música eletrônica, das filas para receber um autógrafo de Ziraldo e Mauricio de Sousa, que ocupavam todo o espaço reservado àqueles que queriam aproveitar a oportunidade para ao menos ler os índices das obras que lhe interessavam, e da constância do fedor de suor de milhares de sovacos suados pela ineficiência do sistema de ventilação.

Quando cheguei em casa, algumas longas horas depois, entrei nos sites das editoras e li as informações que me interessavam.

No meu trabalho, de professor e tradutor, não posso me dar mais o luxo de, toda vez que precisar procurar o significado de uma palavra, levantar-me a bunda da cadeira, ir à estante, procurar o dicionário correspondente e folheá-lo até encontrar a palavra. Em vez disso, com cinco ou seis movimentos automatizados de dedo, encontro o que preciso nos meus muitos dicionários eletrônicos.

A Internet tornou-se a ferramenta fundamental de pesquisa do tradutor de hoje. Nela encontramos respostas para os abismos tradutórios que não encontraríamos em nenhum outro lugar. A miríade de informação acessível, se usada com critério e inteligência, pode representar a diferença entre um trabalho não-feito por falta de recursos e um trabalho muito bem feito.

Depois de algum tempo considerando o que vou escrever agora, sinto-me apto para escrevê-lo sem culpa: não há nada, nenhum recurso do livro impresso que não possa ser substituído ou melhorado pela mídia eletrônica. Estou falando de texto, fotos, vídeos, arquivos de áudio, hyperlinks, referências, facilidade de pesquisa, marcadores, recursos de resumo, indexação, agrupamento, envio, edição, compartilhamento, revisão, publicação, diagramação, distribuição, comercialização, remuneração aos autores e editores, ad infinitum.

Sempre que toco nesse assunto, recebo basicamente duas críticas – a de que os livros especializados só podem ser encontrados impressos; e a de que ler um livro através de um monitor é cansativo e nunca terá o mesmo appeal de segurar um livro nas mãos e folheá-lo.

Uma por vez:

Grande parte dos livros técnicos e especializados, de qualquer área do conhecimento humano, só podem ser encontrados em versão impressa. Verdade… por enquanto. De olho nesse mercado cada vez mais abocanhador, editoras no mundo e no Brasil já estão vendendo e-books (em vários formatos, inclusive em PDF) de livros especializados com o mesmo conteúdo das versões impressas. O único custo não cobrado é o da impressão. Os direitos autorais e o lucro da editora continuam intactos e movendo a engrenagem da produção editorial. As literaturas do mundo ocidental (e boa parte da literatura do extremo oriente) também já estão digitalizadas. Algumas escolas já trabalham exclusivamente com e-books, reduzindo consideravelmente o custo da famigerada lista de materiais de todo começo de ano. Hoje, grande parte dos livros de literatura já podem ser encontrados em versão digital; assim como uma parte dos livros técnicos e especializados (especialmente de áreas como medicina, informática, engenharia e TI). Num futuro não muito distante, é possível que todos os livros possuam versões digitais e impressas ou somente versões digitais. A ambição do projeto Google Books é digitalizar todos os acervos de todas as grandes bibliotecas do mundo.

Para os profissionais que usam livros de referência e precisam consultá-los com frequência, há um sem-número de versões digitais dessas obras para aparelhos celulares como o Iphone. Com o Iphone, um médico tem o compêndio de prognóstico, diagnóstico e farmacêutico (livros com milhares de páginas cada) em qualquer lugar que esteja, com recursos de referência e pesquisa imediata. Não há dúvida que esse tipo de recurso pode ser considerado até uma questão de saúde pública. Advogados têm seus códigos, técnicos em informática têm suas tabelas e diagramas de instalação e configuração, professores de línguas têm seus dicionários – todos dentro de um bolso da calça.

A digitalização de textos (oficial e extraoficial) é, em último caso, um recurso sem precendentes de socialização da cultura e da informação. Em quase dez anos de aquisição de livros impressos, consegui por volta de 2500 livros (metade da meta estabelecida em 98). Nos últimos 2 anos, colecionei em meu computador quase 20 vezes esse número. Isso mesmo, tenho, em meus dispositivos de armazenamento, quase 50 mil livros, acessíveis off ou online. E para quê? Pretendo lê-los todos? De modo algum, mas sei onde os encontrar assim que ou quando precisar deles.

Não há dúvida de que passei a ler muito mais depois que comecei a usar a mídia eletrônica. O fetichismo do bibliófilo deu lugar à genuína sede de conhecimento teórico e prático.

Na década de 90, para resolver um problema desconhecido no meu computador, tive que procurar o telefone de um técnico nas Listas Amarelas, esperar por sua disponibilidade por cerca de 4 dias, e pagar uma boa parte de minha mesada/salário pela visita (que, salvo engano, não resolveu o problema). Há algumas semanas, após perceber um erro desconhecido no meu computador (muito parecido com o que havia ocorrido em 98), acessei um fórum americano de técnicos em informática, pesquisei sobre casos parecidos com o meu, li alguns tópicos e resolvi o problema – a custo zero e em duas horas de pesquisa e aquisição de conhecimento. É importante enfatizar que, ao aprender para fazer, no exercício da autodidaxia, agrega-se conhecimento em vez de delegá-lo a terceiros.

No entanto, a última e fatídica crítica persiste – não é confortável ler um livro através da tela de um computador, e o feeling de pegar o livro nas mãos e folheá-lo na cama é evidentemente perdido.

Os chamados fetichistas do livro tem certa razão, é muito desconfortável ler trechos longos através do monitor de um computador. No entanto, monitores mais recentes, com taxas de varredura mais eficazes e sistemas antirreflexo facilitam bastante a leitura. É notável a diferença entre ler um texto num monitor CRT e num LCD de última geração.

Muitos gostam de ler na cama, ou em posições indescritíveis sem fotos, e para esses a leitura de textos digitais pode se tornar complicada… ou não. Há hoje uma enorme variedade de e-readers com touchscreen (como este abaixo) que, além de exibir textos, fotos e vídeos, podem ser usados para o acesso à Internet, edição de textos e outras muitas funções de um desktop.

sony-adds-touch-led-light-to-e-reader-1 Para aqueles que dizem que o barato de virar as páginas é perdido, há também os e-readers com telas de LCD touchscreen flexíveis, como este:

philips-flexible-screen-at-ces-2008 Nesse modelo, o usuário literalmente “vira” as páginas para avançar na leitura.

É a mesma coisa? Não, obviamente. O cheiro do papel esses e-readers não têm, assim como não terão o cheiro da gasolina ou o ronco do motor os carros elétricos; como não têm o “barato” de afinar os pianos digitais; como não têm o divertimento do pó de giz na mão os quadros digitais (e-boards); como não têm o legal de fazer força para desaparafusar as aparafusadeiras elétricas; como não têm o barato de carregar uma carteira cheia de notas e cartões os sistema de pagamento eletrônico; como não têm o legal de ter uma estante cheia de discos de vinil o sistema de compra de arquivos de música digitais.

Meu pai já reclamou que a invenção da calculadora fez as pessoas ineptas para fazer contas de cabeça. Nossa geração reclama que os adolescentes que leem pelo computador são ineptos para ler livros. Do que reclamará a próxima?

O mundo muda em progressão geométrica. A mentalidade dos que o mudam, no entanto, tenta acompanhar em progressão aritmética. O fato é que o livro do futuro é o livro sem folhas, sem desmatamento e, mais importante, o livro da socialização do conhecimento.

O livro pra mim está morrendo, e espero que descanse em paz. E pra você?

Tuesday, September 8, 2009

Mini-curso Inimigos da Razão

Aulas: 10 e 17 de outubro (das 14:00h às 17:00h) no ISAT (S. Gonçalo)
Ementa resumida: A razão e a superstição no séc. XXI; Os inimigos da razão - os tratamentos médicos alternativos (acupuntura, homeopatia), a astrologia, as instituições espiritistas, as religiões instituídas. Razão e ateísmo.
Valor: R$ 25,00
Inscrições: rafael.lanzetti@gmail.com

Curso semi-presencial de TRADOS

Curso semi-presencial de Trados

Aulas presenciais: 10 e 17 de outubro (das 10:00h às 13:00h) no ISAT (S. Gonçalo)
Atendimento online: 3 tarefas com atendimento via e-mail, MSN ou Skype.
Ementa resumida: Trados Freelance, criação, utilização e gerenciamento de memórias de tradução; TagEditor, localização de sites e software; MultiTerm, gerenciamento de glossários.
Valor: R$ 100,00 (50% de desconto para alunos do ISAT)
Inscrições: rafael.lanzetti@gmail.com

Palco MP3

Pra quem ainda não me ouviu,

http://palcomp3.com/lanzetti/

Abraço,
Lanzetti

Wednesday, August 12, 2009

Ferreomodelismo + Helimodelismo + férias forçadas pela gripe suína = ?

É isto que acontece quando um ferreomodelista que também é helimodelista tem algum tempo livre por conta das férias suínas:



A construção da maquete já foi relatada neste blog, num post mais antigo. O heli é um Blade MCX (28g) com uma bateria LiPo 1s e Spektrum DX7.



Se fosse no Rio de Janeiro, seria um helicóptero da polícia procurando traficantes, mas como é na Lanzettilândia, é apenas um voo turístico panorâmico.

Pra quem quiser, o heli está à venda em www.knkhobby.com

Um abraço,
Lanzetti

Tuesday, August 4, 2009

Conferência Los Cinco Pilares del Mentalismo


No dia 25/07/09, ofereci aos amigos da Escuela de Magia Mago Larrain de Santiago do Chile, minha conferência de mentalismo "Los cinco pilares del Mentalismo". O espaço que eles têm é fantástico - uma casa inteira no bairro de Vitacura, um bairro nobre da capital chilena, com decoração mágica e espaços para conferências e apresentações em todos os cômodos. Há ainda um dormitório para mágicos visitantes, palestrantes etc.

O pessoal de lá foi muito receptivo e educado comigo e com minha esposa. Gostamos muito de conhecer os alunos e professores. Uma coisa me chamou particularmente a atenção: o quanto eles levam a sério o estudo das Artes Mágicas. No Brasil, qualquer youtubista que consegue aprender um ou dois truques quer ser considerado mágico. Compra meia-dúzia de apetrechos em uma loja virtual de mágica, camiseta e calça pretas, uma maletinha preta e sai por aí importunando as pessoas na rua com efeitos mal elaborados, técnicas sofríveis e patter inexistente.

Mágica é uma arte, e como tal merece estudo teórico e prático, idealmente numa escola de arte, com professores especializados e material/infra-estrutura para auxiliar o desenvolvimento dos aprendizes.

Mas, como no Brasil artista é sinônimo de vagabundo... somos relegados à escória social, e não temos direito e acesso ao que a arte tem de melhor - o conhecimento humano intrínseco à história e à tradição da Rainha das Artes.



Abraços,
Rafael Lanzetti

Saturday, July 11, 2009

Polissemia e interpretação de textos

Olá a tod@s,

escrevo hoje sobre as estratégias de interpretação de um texto poético, The road not taken de Robert Frost, autor norte-americano da Nova Inglaterra, a primeira região colonizada pelos peregrinos ingleses que inclui os estados do Maine, New Hampshire, Vermont, Massachusetts, Rhode Island, e Connecticut. Robert Frost (1874-1963), apesar de nascido na Califórnia, muda-se com sua família para a Nova Inglaterra após a morte de seu pai em 1885. Sua poesia é constantemente associada a essa região, pois utiliza como cenário para boa parte de sua lírica os bosques de conífera típicos do nordeste dos EUA.

Vou me abster aqui de quaisquer outras informações biográficas, a um clique (http://en.wikipedia.org/wiki/Robert_Frost) de distância de qualquer leitor mais curioso, e passar para a degustação do poema que, para mim, é um dos melhores escritos em língua inglesa.

Trata-se de The road not taken, que reproduzo abaixo:

Two roads diverged in a yellow wood,
And sorry I could not travel both
And be one traveler, long I stood
And looked down one as far as I could
To where it bent in the undergrowth;

Then took the other, as just as fair,
And having perhaps the better claim,
Because it was grassy and wanted wear;
Though as for that the passing there
Had worn them really about the same,

And both that morning equally lay
In leaves no step had trodden black.
Oh, I kept the first for another day!
Yet knowing how way leads on to way,
I doubted if I should ever come back.

I shall be telling this with a sigh
Somewhere ages and ages hence:
Two roads diverged in a wood, and I—
I took the one less traveled by,
And that has made all the difference.

Há pouco tempo, falando sobre interpretação textual em sala-de-aula, dei aos alunos o tal poema para que eles fizessem um breve skimming (uma leitura baseada em abordagem top-down cujo objetivo é depreender a ideia principal do texto e sua estrutura coerente). As impressões que eles me comunicaram deram conta do que geralmente chamo de "estrutura coerente superficial" ou "fanopeia superficial".

Para continuar, preciso definir os conceitos de "fanopeia", "logopeia" e "melopeia". Esses três elementos textuais da tipologia literária foram criados por Ezra Pound, tradutor, crítico e teórico da tradução do século passado. A "melopeia" é, para Pound, a musicalidade do texto literário, em especial do gênero lírico, o elemento "(...) no qual as palavras estão carregadas, além de seu significado simples, de alguma qualidade musical, que dirige a maneira ou a finalidade daquele significado". É possível perceber que, em algumas instâncias, a melopeia do texto lírico, notadamente, por exemplo, no caso dos poemas parnasianos, torna-se mais importante que o sentido do poema em si, significante torna-se mais importante que significado, para usar os termos saussurianos. A "fanopeia", por sua vez, é definida por Pound como a imagem gerada na mente dos leitores do texto enquanto o leem. Essa imagem, culturalmente determinada, é também propriedade idiossincrática, já que cada leitor forma, em sua mente, um cenário composto por elementos "apropriados", no sentido de "roubados do texto". A fanopeia de um texto é formada a partir de suas estruturas coesivas e coerentes, dos símbolos culturais presentes, e da "logopeia", "a dança do intelecto entre palavras; os hábitos especiais de uso, do contexto em que esperamos encontrar a palavra, do que habitualmente acompanha seus concomitantes costumeiros, suas posições conhecidas e seu jogo irônico". As línguas humanas oferecem diferentes possibilidades logopaicas, manipuladas com mais ou menos destreza pelos autores que as utilizam como ferramenta.

Muito bem, voltando à interpretação dos alunos, agora usando o termo técnico preciso, a fanopeia que os alunos expuseram durante o exercício foi aquela prontamente apontada por qualquer leitor descompromissado do poema de Frost, que reproduzo resumidamente a seguir:

Na primeira estrofe, o "eu" lírico, ao andar por um bosque, depara-se com uma bifurcação. Decide, então, observar o máximo que podia de cada uma das trilhas disponíveis.

Na segunda estrofe, o "eu" chega à conclusão de que as trilhas eram relativamente idênticas.

Na terceira, o "eu" toma um dos rumos, fica em dúvida se deveria voltar e tomar o outro, mas decide continuar.

Na quarta estrofe, o "eu" diz, com orgulho, que tomou a trilha menos percorrida, oferecendo-lhe uma vantagem misteriosa que teria feito sua vida ter valido a pena.

Interessa-me especialmente a logopeia e a fanopeia da última estrofe, cuja observação pode alterar radicalmente o caminho da interpretação do texto. Chego aqui à moral da história deste post blogueiro - o leitor descompromissado é tentado a se contentar com a estrutura fanopaica superficial. No entanto, para se deleitar com o intrincado jogo de linguagem da poesia, é preciso ir mais além. O próprio Frost disse, certa vez, que o The road not taken "is a very tricky poem", muito embora saibamos que o autor não mais detém o poder semântico sobre seu próprio texto; uma vez escrito, o texto pertence à língua, aos leitores, ao próprio autor (não vamos exclui-lo por completo), à cultura.

Vejamos como começa o poema: "Two roads diverged in a yellow wood". Abrindo parênteses, há aqui uma dificuldade imediata para os que se aventurarem a traduzir o poema, já que o conceito "wood" é bem diferente do que concebemos por "floresta", ou mesmo "bosque". Quando um brasileiro pensa numa "floresta", a fanopeia relaciona-se automaticamente a um clima tropical, a árvores frondosas e altíssimas, a onças, cobras e macacos; uma imagem completamente diferente da que o leitor norte-americano forma ao ler a palavra "wood" (normalmente "woods"), provavelmente composta de coníferas, um clima frio e uma atmosfera escura, esquilos e ursos. Fecha parênteses.

A palavra-chave do verso é "yellow". O que representa um "yellow wood"? Quando é que as folhas amarelam-se? O poema menciona folhas no chão; quando caem? O que representa o outono? O que representa o outono para o imaginário do brasileiro? E do norte-americano/europeu?

Na segunda estrofe, o poema deixa claro que os dois rumos eram "really about the same", com ênfase na palavra "about".

No último verso da terceira estrofe, após ter tomado um dos caminhos, o "eu" demonstra incerteza se deveria voltar. Será? O que pode querer dizer a palavra "doubted"? O "eu" tinha ou não tinha certeza do que estava fazendo? Consegue perceber que há margem para as duas interpretações?

Mas, na última estrofe, num brusco time shift, estão as duas palavras, a meu ver, mais importantes para a interpretação do texto - "sigh" e "difference". Das polissemias elencadas até agora, estas duas parecem-me ser as mais misteriosas. O que quer dizer "sigh"? Existe o "sigh" de "oh, man, I shouldn't have done that..."; mas também existe o "sigh" de "yeah, man, I did it, I made it!" De qual deles estamos falando?

Por fim, o que quer dizer o "difference"? É uma diferença para melhor ou para pior? O resultado final, o destino a que chegou o "eu" após ter tomado o caminho "less traveled by", foi positivo ou negativo? Aliás, sobre o que será de fato o poema - sobre o que se fez ou sobre o que se deixou de fazer? Repare novamente em seu título.

Segundo os teóricos da Estética da Recepção, muito bem representados na figura de Wolfgang Iser, todo texto possui "buracos interpretativos", são como queijos suíços. Alguns buracos são preenchidos automaticamente através de leitura descompromissada; alguns outros são preenchidos pela interpretação, produto de processos cognitivos por parte do leitor; outros ainda não são preenchidos, e devem permanecer assim, como no fatídico caso de Capitu e Bentinho. Betinho era ou não era corno? Resolver a polêmica, tapar o buraco com areia, diminui o texto, por retirar dele uma das possibilidades interpretativas que gentilmente oferece.

A leitura descompromissada ignora elementos fundamentais da logopeia dos textos, neste caso específico a polissemia lexical. A partir dessa ignorância, uma fanopeia com limites definidos é formada. O texto literário, no entanto, oferece muito mais, oferece buracos customizáveis. O texto literário é open source, podemos contribuir para a formação de sua estrutura fanopaica, e geralmente o fazemos a fim de moldar o texto para que se encaixe egoisticamente em nossas próprias expectativas. O cidadão liberal aprecia esse poema por considerar que Frost louva o livre-pensador, o ousado que toma o caminho menos trilhado e se dá bem no final. No entanto, o poema admite a possibilidade interpretativa exatamente contrária, a do viajante nostálgico que gostaria de ter tido a oportunidade de vislumbrar o caminho oposto.

A interpretação descompromissada é apropriadora. O deleite dos intérpretes mais profundos, no entanto, está justamente em reconhecer as possibilidades que o texto nos oferece, sem tomar partido de nenhuma delas, mas admirar suas resoluções hipotéticas.

É um excelente exercício interpretativo detectar, nos textos literários com os quais você entra em contato, uma estrutura logopaica mais rica, que aponte para os dois caminhos no bosque amarelo, em vez de apenas para um deles. Esse exercício de leitura não é limitado à apreciação de textos literários, mas desenvolve a capacidade de compreensão de qualquer texto. A escola brasileira, por décadas presa aos grilhões da gramática e da metalinguagem, parece nunca ter querido oferecer aos cidadãos em formação a capacidade de raciocínio independente, não-superficial, pois aponta fórmulas herméticas para a interpretação de seus textos e da vida.

A religião, o governo e a escola, os notáveis aparelhos ideológicos althusserianos, não admitem buracos. Mas é preciso cavá-los, pois eles existem...

Grande abraço,
Lanzetti

Tuesday, June 2, 2009

Conferência "Os cinco pilares do Mentalismo"



No dia 25/05, ofereci aos amigos da Associação de Mágicos de Niterói a conferência "Os cinco pilares do Mentalismo", dedicada à explicação e ilustração com rotinas das cinco categorias básicas de efeitos de mentalismo - A mnemotécnica, previsões, clarividência, telepatia e hipnose.

Se alguma associação mágica se interessar pela conferência, pode me contactar pelo e-mail rafael.lanzetti@gmail.com

Um grande abraço,
Lanzetti

Friday, April 17, 2009

Contra-argumentos teístas

Como prometido, vou falar sobre os três principais contra-argumentos teístas a respeito da "Grande Pesquisa da Oração".

1. Deus não se submete a pesquisas com objetivos mesquinhos.

Em primeiro lugar, era preciso definir o que é "mesquinho". Vou lhes poupar das definições dicionarísticas e formular a pergunta "mesquinho por parte de quem?". Vamos supor, em primeiro lugar, que os objetivos dos cientistas fossem mesquinhos:

Os cientistas realizaram a pesquisa a fim de provar a ineficácia da oração.
Não é bem assim que trabalha a ciência. No método de Francis Bacon, os dados são colhidos e analisados sem interferência do pesquisador. Sabemos que, sendo humanos, há interferência em qualquer coisa que façamos, dissermos ou interpretarmos. No entanto, a ciência desenvolveu métodos para minimizar essa interferência: i. Pesquisas em grupo e equipes; ii. Peer-review; iii. Testes duplo-cegos; iv. Conselhos Científicos; v. Conselhos Editoriais de periódicos especializados, dentre muitos outros. Se alguém pensa que é fácil publicar uma pesquisa num periódico, mude de idéia. Às vezes tenho a impressão de que os conselhos editoriais partem do pressuposto de que "toda a pesquisa é ruim até que se prove o contrário". Sendo assim, a ciência pode ser considerada a forma mais "isenta" de interpretação da natureza que conseguimos criar.

E se, no entanto, os cristãos intercessores não fizeram bem o seu trabalho?

Bem, a pesquisa teve como voluntários dezenas de fiéis de igrejas diferentes que receberam o primeiro nome e a primeira letra do segundo nome de cada paciente. Foram instruídos para orarem 3 vezes ao dia nominalmente por aquelas pessoas com toda a fé que pudessem. A Bíblia diz em Marcos 11.24 "Tudo o que pedirdes em oração, se crerdes, recebereis", e convenhamos que curar pessoas enfermas que sofrem em hospitais é um objetivo altruísta e moralmente bom. Portanto, mesmo que a pesquisa, os pesquisadores e a ciência fossem mesquinhos, por que Deus não curaria pessoas sofridas, mostrando à humanidade, assim, seu poder sobrenatural?

Se você pensar bem, o fenômeno da oração é egoísta e mesquinho por si. Ambroise Bierce afirmou que “Orar é pedir que as leis do universo sejam anuladas em nome de um único requisitante, confessadamente desmerecedor.”

Existe cena mais patética que Kaká levantando o troféu da FIFA aos céus para agradecer a Deus? Será que nenhum outro jogador no mundo merecia essa dádiva? Apenas Kaká é um fiel seguidor de Cristo dentre os futebolistas? Quantas manchetes do tipo "Jogadores do Flamengo rezam por vitória no domingo" já vimos por aí? Por que o homem se acha mais merecedor que outros? Deus interfere no futebol? Deus interfere na vida humana?

2. Não fazia parte do plano de Deus curar aquelas pessoas.

Esse argumento é utilizado com bastante frequência por teístas. Vamos entender, em primeiro lugar, o que seja o Plano de Deus. Os gregos antigos o conheciam pela personalização da Moira; para os egípcios, cada um dos 12 principais deuses regia o destino daqueles que nasciam sob seu signo; os chineses têm seus 4 pilares do Destino; e os judeus e cristãos, o Plano de Deus.

O Plano de Deus é, segundo os parágrafos que falam acerca desse assunto na Carta do Credo de Nicéia, um destino traçado pelo próprio Deus para a vida de cada um dos habitantes da Terra. No entanto, o homem tem o livre-arbítrio para segui-lo ou não, conforme sua vontade.

Não é preciso pensar muito para chegar à conclusão de que livre-arbítrio e plano de Deus são fenômenos excludentes entre si. Que liberdade nós temos se vamos para o inferno se não seguirmos o plano de Deus? Que plano é esse? Como é que o homem descobre esse plano de Deus? Como o segue? A resposta teísta faz parte do contra-argumento 3.

Em segundo lugar, é preciso observar a questão da moralidade no conceito de plano divino. Um plano divino que permite o sofrimento físico e emocional não pode ser considerado moralmente bom se advindo de um Deus de amor. Qual é o plano de Deus para as crianças do Congo? Será que elas sofrem porque não conseguem entender o Plano de Deus? Qual é o plano divino para as pessoas que não conhecem a Cristo e que, segundo os cristãos, vão para o inferno mesmo assim? Qual é o plano divino para o favelado brasileiro, que come restos de legumes de lixões ou para a menina de 13 anos que se prostitui para poder comer? A maior parte dos cristãos diria: "O mal no mundo é consequência do pecado, do livre-arbítrio que Deus deu ao homem".

O livre-arbítrio, como disse, não existe de facto se considerarmos: i. A moral cristã; ii. Os Mandamentos e a Lei; e iii. A Condenação Eterna. Se existe lei, não sou livre. Se preciso seguir preceitos morais cristãos para não ir para o inferno, não sou livre, sou pseudo-livre, pois meu livre-arbítrio só me leva à condenação eterna. Minha submissão, no entanto, aos preceitos cristãos, me salva.

Quanto à questão do pecado - qual é o pecado das crianças do Congo? Qual é o pecado do miserável latino-americano? Quando os discípulos disseram a Jesus que achavam que o cego era cego porque ele ou seus pais haviam pecado, Jesus disse que estavam errados, mas os discípulos estavam certos! Por que somos pecadores? Porque, segundo a Bíblia, Adão e Eva cometeram o fatídico "pecado original". O pecado é herança genética de nossos ancestrais mitológicos.

Somos pecadores porque nossos pais pecaram; somos mesquinhos e merecemos a condenação eterna; somos seres naturalmente imorais e mataríamos e estupraríamos todas as mulheres se não houvesse a religião. Mas... Deus mandou seu Filho para nos redimir de todos os pecados, passados, presentes e futuros. O que fazer então? Arrepender-nos e aceitarmos a Jesus Cristo como único e suficiente salvador. Os adoradores de Krishna, Horus, Thor, Zeus, o Grande Juju da Montanha etc. (dentre 8.400 deuses catalogados), infelizmente, vão todos para o inferno (segundo os protestantes brasileiros, inclusive os católicos, por serem adoradores de Maria).

O que faz o ser humano crer que está certo e todos os outros errados? Você que está lendo este texto e que nasceu, por mero acaso, no mundo ocidental, deve, creio eu, ter sido apresentado ao Deus judaico-cristão Jeová, e talvez até acredite nele. Se você tivesse nascido no Oriente Médio árabe, acreditaria em Allah; se tivesse nascido na Escandinávia medieval, acreditaria em Thor; se tivesse nascido na Índia, acreditaria em Krishna e suas encarnações; se tivesse nascido no Egito antigo, acreditaria em Horus; se tivesse nascido na África Central, acreditaria no Grande Juju da Montanha. O que o faz pensar que você está certo, e todos os outros deuses e livros sagrados do mundo estão errados? Transporte-se para o Oriente. Imagine-se como um fiel seguidor de Ganesh. O que você diria sobre os cristãos ou muçulmanos? O fato de, também por mero acaso, ter nascido no Oriente faria de você uma pessoa pior? Indigna? Mesquinha? Merecedora do castigo eterno?

Epicuro tratava da questão do mal no mundo de uma maneira racional:

O mal existe. Se o mal existe...

a) Deus quer eliminá-lo, mas não pode. Logo, Deus não é onipotente;
b) Deus pode eliminá-lo, mas não quer. Logo, Deus é sádico;
c) Deus não quer eliminá-lo e não pode.
d) Deus pode e quer eliminá-lo. Logo, Deus não existe.

O problema do mal pode, no entanto, ser resolvido de algumas maneiras:

a) O mal existe porque Deus é mau;
b) O mal existe porque existe o Diabo, que trava com Deus uma batalha cósmica;
c) Deus tem tarefas mais grandiosas a fazer do que se preocupar com o sofrimento humano;
d) Deus é indiferente ao sofrimento porque o sofrimento é um preço justo a pagar pelo livre-arbítrio

Se a, logo Deus não é digno de louvor.
Se b, logo Deus é imoral ou não é onipotente. Se Deus não acaba com o diabo porque não quer, é imoral, pois permite o sofrimento humano; se não acaba com o diabo porque não pode, não é onipotente.
Se c, logo Deus é indiferente (o Deus dos deístas, a "força suprema" que não interfere na vida humana) e, portanto, não é digno de adoração.
Se d, logo Deus é imoral.

Um plano de Deus que permite o sofrimento de seus fiéis é imoral. A concessão de um pseudo-livre-arbítrio que leva à condenação eterna, ao sofrimento e ao pecado é imoral. O fato de Deus ter privilegiado a Palestina e, hoje, o mundo ocidental com a influência do cristianismo e com o Cristo é imoral. Os atos divinos relatados na Bíblia (V.T.) são imorais. No entanto...

3. A influência da oração não pode ser medida com métodos científicos.

Esse é talvez o mais frequente argumento dos teístas quando se deparam com questões racionais relacionadas a Deus: Deus não é passível de estudo, ou da compreensão humana. Deus está além do entendimento do homem.

Muito bem, vamos supor que Deus exista, e que seja realmente numênico, ou seja, que exista fora dos planos do tempo e espaço humanos. Então:

a) Deus não interfere na vida humana; ou
b) Deus se manifesta para interferir na vida humana.

Se Deus não interfere na vida humana, a inspiração divina dos autores bíblicos é uma mentira. Se Deus, no entanto, sendo numênico, interfere na vida humana, ele precisa se "manifestar".

Somos seres no tempo (Heidegger) e vivemos num mundo fenomênico. Tudo o que ocorre aqui, ocorre no tempo e se torna um "fainómenos" ("aparição", em grego). Os fenômenos são perceptíveis. Alguns fenômenos são incoscientemente percebidos; outros, conscientemente, mas todos os fenômenos passam pelos filtros dos 5 sentidos humanos, acrescidos de sua cultura.

Se Deus se manifesta a ponto de ser percebido pelo homem (como uma grande luz, como inspiração [do latim "soprar para dentro"], como revelação etc.), Deus se torna fenômeno. E, nesse ínfimo instante em que Deus se faz fenômeno, ele é passível de racionalização. No entanto, a ciência, desde seu nascimento com Galileu e Newton até o século XXI, não teve a oportunidade de estudá-lo porque nenhum fenômeno divino até hoje foi reportado com evidências comprováveis.

Mesmo com um Deus "tímido", seria possível estudar as consequências das interferências de Deus como, por exemplo, o número de pessoas que apresentam melhoras no estado clínico ao receberem a bênção de Deus. O Santuário de Lourdes, por exemplo, recebe 80.000 enfermos por ano (muitos levados em macas e cadeiras de rodas). Em mais de 100 anos de peregrinações, a Igreja, de acordo com seu próprio "Conselho Científico", comprovou 66 curas. O resultado é uma proporção estatisticamente irrelevante. Mesmo assim, as 66 curas ocorreram em órgãos internos ou em patologias que, segundo estatísticas médicas, podem desaparecer sem motivo aparente por defesa do próprio organismo (e, acreditem se quiserem, isso ocorre até com ateus!). Uma pergunta antiga e sem resposta: por que Deus não restaura uma perna a um amputado? Por que as curas são sempre internas?

Por fim, o contra-argumento último de um teísta é sempre no campo pessoal: "Deus existe porque eu sei, eu o sinto, ele falou comigo." ou "Deus me curou do câncer, pois eu fiquei bom depois que eu pedi com fé".

Esse argumento é conhecido como "Argumento da Experiência Pessoal" e será tema de um post futuro.

Grande abraço,
Lanzetti

Wednesday, March 25, 2009

O poder da oração

Em Deus, um delírio, Richard Dawkins relata uma pesquisa de 2,4 milhões de dólares financiada pela Templeton (basicamente uma instituição que premia com milhares de dólares qualquer cientista que conseguir produzir "evidências" sobre a verdade bíblica), sob liderança de Herbert Benson, cardiologista do Mind/Body Medical Institute - Boston.

1802 pacientes de 6 hospitais participaram; todos haviam sido submetidos a cirurgias de ponte de safena e/ou mamária. Os pacientes foram divididos em 3 grupos: no grupo 1, os pacientes receberam orações, mas não sabiam disso; no grupo 2, os pacientes não receberam orações; e no grupo 3, os pacientes receberam orações e sabiam. As orações foram feitas por 3 igrejas em Minnesota, Massachusetts e Missouri. Todas as orações continham a sentença "por uma cirurgia bem-sucedida com uma recuperação rápida e sem complicações".

Resultados
: Não houve diferença na recuperação dos pacientes que receberam orações e dos que não receberam, mas houve diferença entre os que sabiam que estavam recebendo orações. A diferença foi que eles apresentaram mais complicações pós-cirúrgicas que todos os outros pacientes. Os cientistas explicaram o fenômeno com o conceito de "ansiedade do desempenho", um fenômeno neurofisiológico consequência da sensação de responsabilidade que os pacientes sentiram ao saber que alguém estava orando por eles. Alguns podem ter inclusive pensado que "se alguém está orando por mim, é porque meu caso é mesmo grave!"

A conclusão final é que a oração a Deus é tão eficaz quanto o uso de uma ferradura, ou pé-de-coelho, é uma superstição.

Os contra argumento teístas geralmente percorrem as seguintes linhas:

1. Deus não se submete a pesquisas com objetivos mesquinhos;
2. Não fazia parte do plano de Deus curar aquelas pessoas;
3. A influência da oração não pode ser medida com métodos científicos.

Em posts posteriores, vou abordar a contra-argumentação a essas 3 linhas de pensamento.

Um abraço,
Lanzetti

Friday, January 16, 2009

4o Encontro Mágico de Juiz de Fora

Amigos mágicos, participem do 4o Encontro Mágico de Juiz de Fora. Confiram os detalhes do encontro clicando na foto abaixo.

Grande abraço,
Lanzetti

Thursday, January 15, 2009

Maria Fumaça em S. João del Rey

Olá, pessoal,

uma passada rápida apenas para registrar mais um capítulo da odisséia ferroviária in terra brasilis: um passeio de 40 minutos de M. Fumaça partindo de S. João del Rey até Tiradentes, ambas cidades históricas do ciclo do ouro mineiro (o marco da famosa Estrada Real fica entre as duas cidades).



O passeio utiliza a malha da antiga EFOM (Estrada de Ferro Oeste de Minas) em bitola estreita de 0,76 m. A composição era formada de uma ten-wheeler "mascarada", porque foi adaptada para utilizar diesel como combustível, mas ainda possui o tender (que funciona de tanque) e 10 (salvo engano) vagões de passageiros de madeira.



Partindo de S. João del Rey, a composição deixa aos poucos para trás os limites urbanos e rurais da cidade, passa pela Serra de S. José e margeia o Rio das Mortes até chegar, 12 Km e 40 e poucos minutos depois, em Tiradentes (antiga S. José del Rey), onde o alferes teria passado 10 anos de sua vida e onde muitos eventos confidentes teriam ocorrido.



É interessante observar, das janelas dos vagões, parte dos caminhos por onde escoava-se o ouro das minas gerais. A paisagem em si durante o percurso não é nada de extraordinário, o passeio vale mais pelo trem que pelo percurso.

Em S. João há, na estação, um museu ferroviário relativamente bem organizado com peças interessantes. Falando em museu, dois museus de que gostei muito em S. João foram o museu Tancredo Neves (não podia deixar de ser - um museu em sua homenagem em sua cidade-natal) e o museu da FEB, localizado no Regimento de Infantaria de Montanha da cidade.

Em Tiradentes, não deixe de conhecer as igrejas étnicas - a dos brancos, a dos mulatos e a dos negros. A primeira, a Matriz de Santo Antônio, disputa com Ouro Preto o posto de 2a igreja com maior quantidade de ouro forjado em sua arquitetura - perto de meia tonelada do metal.




Em Tiradentes há também, na estação do séc. XIX, um virador manual de locomotivas ainda utilizado para manobrar a ten-wheeler de volta para S. João.







O bilhete de ida-e-volta custa R$ 30,00.



Um abraço,
Lanzetti