Textos sobre tecnologia, linguística, tradução, filosofia, mágica, línguas estrangeiras, modelismo, música.
Friday, July 27, 2007
Como entrar para o mercado de trabalho de tradução em 10 minutos
aqui está o texto completo da minha palestra no III Simpósio de Tradução do SENAC-Rio, dia 28/07/07:
Em primeiro lugar, para entender o título da apresentação, vamos analisar a oração de duas formas:
1. [Como entrar] para o mercado de trabalho [em 10 minutos]. Aqui, o sintagma preposicional [10 minutos] é um modificador do verbo [entrar], um adjunto adverbial do verbo.
2. Como [entrar para o mercado de trabalho] em 1 hora. Aqui, o adjunto adverbial modifica a oração formada por VERBO + COMPLEMENTO (sintagma preposicional, ou objeto indireto).
Em suma, segundo a análise 1, é possível, em 10 minutos, entrar para o mercado de trabalho de tradução a partir dos passos que descreverei aqui. Em contrapartida, segundo a análise 2, é possível, em 10 minutos, aprender o que seja necessário para entrar para o mercado de trabalho de tradução, o que pode durar 1 dia, 1 ano ou uma vida. A interpretação correta do título é obviamente a segunda. Mas percebam que essa ambiguidade, bem-vinda nos textos propagandísticos como esse e nos literários, não é um bom recurso estilístico em textos técnicos, em que a precisão é sempre a ordem do dia. O tradutor deve, em primeiro lugar, perceber tais ambiguidades e: 1. traduzi-la ou 2. eliminá-la, onde for o caso.
Voltando ao assunto principal, quero começar com uma descrição mais detalhada de quem é o tradutor de hoje.
Quem pode traduzir?
A profissão é reconhecida pelo Ministério do Trabalho (como consta aqui), o que quer dizer que você pode ter a sua Carteira de Trabalho assinada como tradutor, e pode preencher aqueles formulários de loja de eletrodomésticos com tradutor como profissão (muito embora isso lhe dê um grande trabalho para explicar ao lojista o que um tradutor faz).
No entanto, a profissão não é regulamentada, não existe nenhum órgão oficial que aplique uma prova de regulamentação, como fazem a OAB, o CREA, entre outros. Assim, qualquer pessoa, sem nenhum pré-requisito, pode ser tradutor, mesmo sem ter completado o ensino fundamental. Existem sim as provas de certificação, feitas por instituições como a ABRATES, que certifica tradutores e intérpretes em vários idiomas. Mas para que serve uma prova dessas? Se você passa (geralmente a prova é o seguinte: tradução de 5 textos, 4 técnicos e um geral ou literário e uma entrevista no idioma estrangeiro), recebe um certificado de qualificação e tem o direito de colocar seu contato na lista da Associação, que é repassada a empresas e clientes em potencial. Os tradutores possuem ainda um sindicato da categoria, o SINTRA, com um site bastante informativo e uma sugestão de preços de tradução (apenas uma sugestão, pois os sindicatos no Brasil não podem tabelar preços).
Além disso, existem muitas listas de discussão online de tradutores, como a TradBR, a Literatti e os informativos da ATPIESP (a Associação dos Tradutores Públicos de São Paulo), entre outros. O que não falta é informação disponível online.
Bem, para descrever melhor o tradutor de hoje, voltarei 50 anos no tempo para descrever esse tradutor de outrora. Vamos tomar como exemplo um tradutor de medicina da década de 1950 - era sempre um velhinho barrigudo, médico aposentado, com uma vasta biblioteca especializada e grande conhecimento da área, e este era o seu diferecial. Apenas ele podia traduzir textos de medicina, porque o conhecimento técnico era restrito ao grupo profissional.
Hoje, qualquer pessoa pode traduzir medicina, ou qualquer outra área - simplesmente porque o conhecimento é público, acessível online a qualquer hora do dia ou da noite; e, com as ferramentas de pesquisa de que o tradutor de hoje dispõe, é possível traduzir um texto sem nunca ter tido contato à área a que pertence. Às vezes, é possível traduzir um texto sem ao menos entendê-lo (ih... complicou, esse assunto é belicoso, mas vou voltar a ele noutro dia).
O tradutor de hoje, segundo estatísticas, é jovem, inexperiente, com múltiplos recursos bibliográficos e armado com um sem número ferramentas e estratégias de pesquisa online.
Como anda o mercado de tradução?
Com fins didáticos, vamos dividi-lo em 3: o mercado de tradução literária, o de tradução técnica e de outras categorias de tradução.
1. O mercado de tradução literária: Nos últimos 20 anos, o mercado editorial brasileiro vem crescendo absurdamente, por conta, é claro, da expansão comercial das redes de livraria, da oferta de livros online e dos sites de compra. Segundo o SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros), no ano de 2004, foram publicados 34.858 títulos no mercado brasileiro e quase 80% deles eram traduções! Se pegarmos qualquer lista de best-sellers em qualquer jornal ou revista nacional, podemos perceber que, constantemente, os 7 ou 8 primeiros colocados em qualquer que seja a categoria (ficção, não-ficção, auto-ajuda) são traduções. A conclusão a que chegamos é a de que o mercado de tradução literária está crescendo muito. Mas... (e na vida há sempre um "mas...") quem traduz literatura? As grandes obras literárias, os clássicos, os Shakespeares, os Borges, os Goethes e os Mallarmés da vida são traduzidos por professores renomados, pesquisadores, escritores, enfim, por aquelas figurinhas de intelectuais (às vezes intelectualóides) carimbadas. O que sobra aos tradutores inexperientes ou aos meros mortais são os best-sellers, que vendem muito e têm atualizações e novas versões constantes. É claro, no entanto, que o que um grande professor de literatura inglesa ganha para traduzir Shakespeare equivale ao que um tradutor comum ganha para traduzir 10 best-sellers (ou mais).
2. O mercado de tradução técnica: Aqui estamos falando de quase 90% do mercado de traduções, portanto, se você quer começar a traduzir, é mais fácil e rápido começar por aqui. O mercado de tradução técnica está subdividido em duas categorias - a de textos que considero "hard", os manuais de máquinas de produção, as especificações de engenharia de produção, as normas de segurança e regulamentações diversas, enfim, textos internos que são lidos por funcionários das empresas; e a de textos "soft", voltados para o consumidor final, como manuais e especificações de produtos, além de textos técnicos voltados para o público leigo. As áreas técnicas de maior fluxo de tradução no mundo são:
Informática e engenharia da computação
Medicina
Engenharia de produção (mecatrônica)
Mecânica (automotiva)
Eletrônica e eletricidade
Economia e finanças
Au concour: textos legais (contratos, documentos diversos). Digo au concour porque, geralmente, estas traduções são feitas por tradutores juramentados, conforme citei num post anterior.
No Estado do Rio de Janeiro, as áreas de maior fluxo são:
Petroquímica
Medicina
Mecânica (automotiva)
E em SP:
Economia & finanças
Engenharias
Informática & localização
3. Localização: Localizar é o contrário de globalizar. As mega-corporações que lançam produtos e serviços no mundo inteiro já chegaram à conclusão de que nem tudo pode ser em inglês, com jeito de americano, os produtos precisam ser personalizados para mercados nacionais diferentes, com gostos diferentes. O termo localização passou a ser usado com o sentido de tradução de sites e software para atender a mercados específicos. Essa localização não é, obviamente, apenas estrutural, mas passa por filtros estilísticos para satisfazer a psique de cada país ou região. Como o Brasil é um dos maiores consumidores de produtos de informática no mundo (só perde para os EUA, Japão, Canadá e Alemanha), a quantidade de texto para se traduzir é absurda e, consequentemente, o número de agências de localização também. Essas grandes empresas de localização (muitas já se tornaram multinacionais) possuem, em seu rol de funcionários e colaboradores, Project Managers, terminólogos, lexicólogos, engenheiros da computação, designers, tradutores e revisores. Todo o trabalho é feito em equipe, seguindo manuais de estilo e glossários específicos elaborados muitas vezes pelo próprio cliente encomendador do serviço. Muitos desses tradutores de sites e software não são registrados em nenhum órgão, não receberam nenhuma formação, e ganham pouco, por conta do uso de Memórias de Tradução (vou falar sobre isso num outro post), e são obrigados a trabalhar com ferramentas digitais especiais e programas diversos.
4. O mercado de tradução midiática: Há uma carência grande de profissionais de legendagem qualificados e treinados no Brasil, por conta da carência de cursos específicos. Os legendadores precisam dominar softwares especiais e ter boa capacidade de síntese, e o serviço de legendagem deve ser sempre muito bem revisado para evitar as famosas "gafes" de legendagem.
5. Tradução para jornais e revistas: Estas são feitas quase sempre por jornalistas sem qualquer treinamento ou formação em tradução. Em sites de sindicatos de jornalistas, é possível encontrar tabelas de preços de serviços que incluem tradução. É mais uma prova de que o tradutor continua "invisível" na sociedade brasileira.
Conclusão sobre o Mercado
É notável o crescimento do mercado de trabalho de tradução, tanto no Brasil como no mundo, por conta da Globalização e da maior participação do Brasil no mercado internacional. Observo também um aumento constante dos cursos de formação de tradutores (livres, técnicos, bacharelados, pós-graduação lato e stricto sensu), mas o mercado ainda é muitíssimo desorganizado, com uma variação incrível de preços, sem profissionais formados e qualificados, sem reconhecimento público.
Com que línguas trabalhar?
Com o inglês, certamente, não preciso comentar o porquê; com o espanhol, que vem crescendo muito ultimamente por conta da maior participação do Brasil no Mercosul; o francês tem pouca demanda, o que me parece estranho se considerarmos o grande número de empresas francesas no Brasil (como a Peugeot e a Renault, só para citar duas); o alemão sofre com a falta de tradutores qualificados, pois há muitas empresas alemãs no Brasil que preferem enviar os textos em inglês porque cansaram de procurar tradutores de alemão; o italiano tem pouquíssima procura, mas ainda assim há muitos tradutores de italiano que ganham a vida (muito bem) com textos da FIAT e da LAVAZZA. No entanto, quero encorajar a todos que lerem este texto a aprenderem as chamadas línguas "eróticas": sueco, dinamarquês, norueguês, russo, tcheco, polonês, japonês, MANDARIM, coreano, hebraico, árabe e afins. Esses tradutores, embora não tenham o mesmo fluxo de tradução dos tradutores de inglês, abocanham uma fatia pouco mordida do mercado de tradução - e assim entram para o seleto grupo de tradutores que traduzem pouco e ganham tão bem quanto seus colegas de inglês e espanhol. Ah, e o MANDARIM está em caixa-alta, e não é porque esbarrei o dedo no Caps Lock.
O professor João Azenha, da USP, disse, certa vez: “O mercado de tradução está em expansão, mas apenas para os bons tradutores, apenas para aqueles com sólida formação, experiência e ética profissional.”
A pergunta agora é: onde posso estudar tradução? Em nível técnico (cursos de 2 anos, com diploma técnico ou certificado), no Rio de Janeiro, o SENAC-Rio e a PUC-Rio são as únicas instituições atuantes. Em nível superior, há a PUC-Rio e o ISAT (Instituto Superior Anísio Teixeira). Em nível de pós-graduação lato sensu, há o próprio ISAT, a PUC-Rio e o SENAC-Rio. Pós-graduação stricto sensu, apenas na UFRJ (Linguística Aplicada/Tradução).
Como trabalhar
1. Freelancer: o tradutor trava contato direto com o cliente, sem intermediários;
2. Freelancer para agências de tradução: a agência, que capta os clientes, terceiriza o serviço, contratando tradutores para serviços avulsos, ficando com (boa) parte do lucro;
3. In-House: tradutores funcionários de agências de tradução ou de grandes empresas que recebem um salário fixo (e comissões) mensal. Grandes empresas como a Petrobrás e a Mercedes possuem um quadro de tradutores in-house;
4. Consultor: prestando consultoria a projetos de tradução de terceiros, com informações técnicas ou linguísticas específicas;
5. Revisor/copydesk: em editoras ou agências de tradução
Quem ganha mais?
Essa pergunta é capiciosa, e leva a uma resposta abstrata. É difícil dizer, por conta principalmente do instável mercado brasileiro. É certo que um tradutor in-house, principalmente de uma grande empresa como a Mercedes, ganha mais (de R$ 2000,00 até mais de R$ 7000,00), mas pode ser que tenha que trabalhar mais que um freelancer. O freelancer, por sua vez, precisa saber trabalhar muito, rápida e eficazmente, precisa saber fazer auto-propaganda, precisa saber conviver com meses de vacas gordas e outros, de magras. O tradutor freelancer que trabalhar para agências ganha menos, mas não precisa investir em marketing para atrair clientes, pois a agência desempenha esse papel. No primeiro ano de serviço, o tradutor pode ter prejuízo, até conseguir uma cartela de clientes razoável, adquirir todo o equipamento necessário e aprender a trabalhar rapidamente.
Como, então, entrar para o mercado?
Vou começar dizendo como NÃO entrar:
1. Enviando e-mail para editoras dizendo: “Olha, seu tradutor cometeu um erro crasso de tradução. O “certo” seria XYZ. Ademais, gostaria de oferecer meus serviços de tradução e envio em anexo meu CV.”
2. Com um cartão de visitas com os dizeres: “Professor de paraguaio. Traduções e versões de textos de todas as áreas.” Professor de idiomas é uma coisa, tradutor é outra. Saber uma língua não equivale a saber traduzir. Quando se aprende um idioma, aprende-se 4 habilidades - ler, escrever, falar e entender. A tradução é uma 5a habilidade, ainda mais complexa, que requer treinamento específico.
Agora, os passos para entrar para o mercado:
1. Formação - procure um curso de formação de tradutores, é a maneira mais fácil e eficiente de começar a traduzir. A palavra curso vem do particípio passado do verbo latino correre, e quer dizer corrido. Um curso é, portanto, uma maneira rápida e prática de aprender, sistematicamente, tudo que você poderia aprender sozinho mais lentamente, quebrando a cabeça e a cara a cada tentativa e erro.
2. Aquisição de equipamentos - os equipamentos básicos para um tradutor são: a) um computador decente, com processador de 2.0 GHz, 1.0 GHz de RAM, HD de 40 Gb, Monitor LCD (sua vista agradece), uma boa impressora, fax, scanner e um teclado ergonômico (seus pulsos agradecem); b) conexão permanente à Internet (não precisa ser muito boa, basta que você tenha acesso à Internet a qualquer momento que precise); c) Programas: Windows XP, Office, Acrobat Reader (para ler arquivos PDF), Solid Converter (para convertê-los para DOC), Babylon (dicionário-glossário indispensável), Subtitle Workshop (para fazer legendagens), TRADOS e Wordfast (programas de memória de tradução, conhecidos como CAT Tools), HTTrack (para fazer download de páginas inteiras da Internet para serviços de localização), Houaiss (dicionário eletrônico da língua portuguesa), Oxford English Dictionary, DRAE ou qualquer outro dicionário eletrônico da língua estrangeira com que trabalha, Micro Power English Works Gold (bom dicionário multilíngue), Project da MS (para gerência de projetos), pinball, freecell e campo minado (porque ninguém é de ferro...) d) Linha telefônica e celular.
3. Prática assistida - obtida nos cursos de formação de tradutores. É a oportunidade que você terá de errar sem ser esculachado por seus clientes. A partir das minuciosas correções dos professores de tradução, você poderá conscientemente lapidar seus métodos e estratégias de tradução até chegar num produto aceitável;
4. Construção da auto-confiança - também obtida durante um curso. Quando o tradutor se torna auto-confiante, usa menos o dicionário bilíngue, revisa poucas vezes o texto traduzido, trabalha mais rápido e melhor;
5. Formação do know-how - A melhor fonte de know-how tradutório são, sem dúvida, os professores de tradução (já que os tradutores profissionais dificilmente cederiam o seu). Esse know-how inclui estratégias de pesquisa, acesso a glossários específicos de muitas áreas técnicas, manuseio de programas de memória de tradução e domínio da utilização dos procedimentos tradutórios;
6. Propaganda e captação de clientes - O tradutor deve possuir idealmente um site em que faça propaganda dos seus serviços, além de um cartão de visitas. É possível também fazer propaganda em comunidades do Yogurte ou em listas de discussão, tendo sempre a preocupação ética de evitar o spam. Deve enviar e-mail a clientes em potencial e visitar empresas que necessitem de serviços de tradução.
O que fazer para fidelizar clientes?
1. Dar desconto? Não. O comerciante que dá desconto em um produto apenas prefere diminuir sua margem de lucro para vender mais. Os tradutores trabalham com produto intelectual. Se um tradutor cobra X para traduzir uma lauda e dá um desconto de 30% para traduzir 100 laudas, de nada adiantará, porque o trabalho que terá para traduzir as 100 laudas será sempre o mesmo. Bons clientes sabem valorizar o preço de serviços bem prestados, os descontos podem até desvalorizar o seu serviço e viciar o cliente.
2. Trabalhar rápido - o tradutor que quer ganhar $$$ precisa trabalhar rápido. Mas a que velocidade? Bem, o que define a velocidade com que o tradutor trabalha é: 1. o grau de familiaridade do tradutor com o assunto do texto; 2. velocidade de digitação; 3. domínio dos recursos de informática; 4. uso de CAT Tools; 5. Domínio de estratégias de busca online; 6. acesso a glossários específicos. O ideal é que tradutores consigam traduzir de 8 a 10 laudas por dia (uma lauda eletrônica é composta de 1000 caracteres sem contar os espaços), mas muitos tradutores conseguem traduzir de 10 a 20 (ou mais) laudas por dia.
3. Respeitar prazos - tradução entregue fora do prazo = cliente perdido. Eu uso sempre o que chamo de "estratégia da CEDAE". A CEDAE, quando precisa efetuar algum conserto nas tubulações de uma rua, avisa que faltará água por 5 dias. Ao final do 2º, no entanto, o fornecimento já está normalizado, o que passa aos clientes uma sensação de rapidez e eficiência. Sacaram?
4. Qualidade - infelizmente, o fator qualidade ainda vem em 4º lugar, mas isso tem aos poucos mudado, e grandes empresas já tem se dado conta que traduções baratas e ruins acabam não valendo a pena, pois precisam muitas vezes ser refeitas.
5. Preço - pode estar na 1ª ou última colocação, dependendo do cliente. É importante saber cobrar um preço justo, tanto para o tradutor quanto para o cliente. Em inglês, existe uma diferença fundamental entre fair price e just price. Acho que prefiro deixar essa discussão para um futuro próximo.
Atualização
Como em qualquer outra profissão, o tradutor deve atualizar-se sempre em simpósios, seminários, cursos de curta duração e treinamentos em novas versões de programas especiais.
É possível viver de tradução?
A resposta é sim. A próxima pergunta é: como você quer viver? A profissão de tradutor no Brasil é como muitas outras, não tem grandes vantagens, nem grandes desvantagens, depende única e exclusivamente do estilo de vida que você quer ter. Listo aqui alguns prós e contras.
Prós:
“Flexibilidade” de horário
Trabalhar em casa
Ser o seu próprio patrão
Custo de manutenção relativamente baixo
Contras:
“Ondulação” do fluxo de serviço durante o ano
Necessidade de constante propaganda
Nos últimos meses, o mercado tem sofrido relativa queda, e muitos colegas meus (e eu) têm tido diminuição no fluxo de traduções, em grande parte devido às grandes agências que "abocanham" a maior fatia do mercado, reduzem os custos, o preço final da tradução e, consequentemente, os ganhos dos tradutores. Observe também um grande influxo de tradutores inexperientes que aceitam fazer traduções por preços mais baixos e, assim, fazem com que o preço de mercado entre em queda constante.
Para você que está começando agora, o percurso natural de um tradutor em formação seria o seguinte:
1º passo: estágio em uma agência de tradução
2º passo: trabalhar como freelancer para uma agência
3º passo: trabalhar como freelancer para os seus próprios clientes
4º passo: abrir sua própria empresa de tradução
Existe, ainda, uma alternativa bastante razoável - a cooperativa de tradutores, um grupo de 21 pessoas trabalhando em prol do mesmo objetivo (esta aí uma boa opção para uma turma de curso de tradução recém-formada).
De qualquer maneira, termino este longo texto com 3 citações que lhe servirão de incentivo:
“Do suor de tua face comerás o teu pão” (Livro de Gênesis) - é a máxima bíblica que exalta o esforço, em detrimento da "sorte", como citei no post sobre os instrumentos musicais (visão protestante vs. visão católica)
“A professional is a man who can do his job when he doesn’t feel like it. An amateur is a man who can’t do his job when he does feel like it.” (James Agate) - um incentivo à formação sistemática.
“I have long been of the opinion that if work were such a splendid thing the rich would have kept more of it for themselves.” (Bruce Grocott) - só para que todos entendamos que traduzir é um trabalho, e não um hobby. Existem coisas muito mais prazerosas a se fazer nas poucas horas vagas.
Desejo boa sorte a tod@s que, salvos todos os contras, decidem embrenhar-se pelas trilhas tradutórias - ermas, árduas, mas que podem ser recompensadoras. Basta persistir.
Grande abraço,
Rafael Lanzetti
ATUALIZAÇÃO (MAIO DE 2010)
Infelizmente o curso técnico do SENAC-RJ não existe mais.
Minha empresa, a Premium Traduções (www.premiumtraducoes.com.br) oferece cursos online de curta e longa duração em formação de tradutores. Oferecemos cursos de legendagem, tradução técnica de diversas áreas, línguas e cultura.
Para obter mais informações, acesse nosso site ou entre em contato pelo e-mail rafael.lanzetti@gmail.com
Um abraço,
Lanzetti
ATUALIZAÇÃO (SETEMBRO DE 2011)
Olá, pessoal, não deixem de notar que o post é de 2007, considerem que muitas informações já estão desatualizadas como, por exemplo, as configurações de um bom PC para tradutores e a lista de softwares necessários.
Um abraço,
Rafael Lanzetti
ATUALIZAÇÃO (JUNHO DE 2016)
A empresa citada na atualização de maio de 2010 não existe mais, pois decidir sair do Brasil há alguns anos. Infelizmente as perspectivas para tradutores no Brasil não são boas, tal qual todas as outras perspectivas de mercado no país. Há cada vez menos agências de tradução, que por sua vez exploram cada vez mais os tradutores, trabalham com pessoal sem formação específica, sem experiência, pagando valores miseráveis. Infelizmente, para ser honesto, preciso dizer que não é uma atividade com futuro promissor.
Wednesday, July 11, 2007
Navegar é preciso
começo hoje uma série (não sucessiva) de textos sobre um dos meus hobbies: o modelismo. Neste texto, quero divulgar a modalidade do modelismo talvez menos conhecida e praticada no Brasil, o nautimodelismo.
Bom, o que é modelismo? A grosso modo, é a atividade de recriar, em escalas menores, aviões, tanques, carros, navios, barcos, trens, pessoas ou virtualmente qualquer coisa existente na natureza ou construída pelo homem. O modelismo que recria aviões denomina-se aeromodelismo; e os que recriam trens e carros chamam-se, respectivamente, ferreomodelismo e automodelismo.
Existem duas categorias principais de modelismo - o estático e o dinâmico. O estático, muito praticado por entusiastas da miniaturização, sendo a modalidade mais conhecida o plastimodelismo, que trabalha exclusivamente com polímeros, talvez seja o mais minucioso, atento a todos os detalhes existentes nos objetos em escala cheia (1:1) retratados.
O modelismo dinâmico, por sua vez, motorizado ou não, tem por finalidade recriar, em escala, principalmente meios de transporte (civis e militares) que se movimentam, principalmente por meio de rádio-controles. No entanto, existem algumas submodalidades de aeromodelismo e nautimodelismo que utilizam elásticos para propulsão, os VCC, e não usam motores.
Afunilando mais ainda o ramo, dos modelos motorizados, existem os que usam motor à explosão e os que usam motores elétricos. Quais seriam as diferenças fundamentais? Os motores à explosão, conhecimentos por "glow", por conta do combustível especial que utilizam, são utilizados em modelos (aero, nauti e auto) pesados, feitos de madeira balsa, fibra ou outros materiais mais pesados. Para praticar o aeromodelismo glow, por exemplo, é necessário procurar um espaço amplo, com pista de pouso e decolagem, ou afiliar-se a um aeroclube (na cidade do Rio de Janeiro existem 3). Esses modelos devem ser manuseados com extremo cuidado, o aeromodelista precisa ter consciência dos riscos que a diversão pode trazer e fazer de tudo para minimizá-los (um dia escrevo sobre esses riscos).
Por outro lado, existe o modelismo elétrico - que usa motores que transformam energia elétrica em dinâmica. Eu sou aero, auto, nauti e ferreomodelista, e pratico apenas o modelismo elétrico. Por que razões? Em primeiro lugar, porque os motores elétricos não poluem, e essa talvez seja a principal razão. Em segundo, porque os motores elétricos utilizam baterias recarregáveis, reaproveitáveis centenas de vezes, e por conta disso a manutenção da brincadeira sai bem mais barata. Em terceiro, porque os modelos elétricos podem ser usados em praticamente qualquer lugar, por serem mais leves (os aeromodelos elétricos conhecidos como park flyers são feitos de depron, um isopor um pouco mais denso que o normal), menores e menos perigosos. Em suma, se um avião elétrico cai, o prejuízo pode chegar a, dependendo do modelo, R$ 700,00. Se cai um avião glow, o prejuízo pode passar dos R$ 3000,00.
Voltemos ao nautimodelismo. O modelismo é a recriação, em escala reduzida, de embarcações reais existentes ou históricas, militares, mercantes ou esportivas, construídas a fim de se reproduzir todos os detalhes de uma embarcação 1:1. No Brasil, a prática começou na década de 1930, com Hely Bricio do Valle. Em 1945, o nautimodelista João Avelino Sidov construiu 21 modelos. Em 53, Leopoldo Geyer encomendou ao construtor Brício o modelo do veleiro Cayru. Assim começou de fato, no Rio de Janeiro, a prática do nautimodelismo no Brasil. No Museu Histórico da Marinha no Rio de Janeiro, está em exibição a Coleção Alves Camara com dezenas de modelos de embarcações regionais que foram desaparecendo aos poucos com o surgimento da ferrovia. Lá também é possível conhecer os modelos dos navios militares da nossa frota. Em São Francisco do Sul, SC, encontra-se uma enorme coleção de peças de modelismo naval no Museu Nacional do Mar.
Hoje, o nautimodelismo possui diversas associações e grupos espalhados por todo o território nacional, mas poucos em real e ativo funcionamento, o que é uma pena. Em São Paulo, no Ibirapuera, existe o modelódromo para praticantes de várias modalidades de modelismo, inclusive com um tanque de nautimodelismo.
No Rio de Janeiro, o único tanque de nautimodelismo que conheci foi o do Aterro do Flamengo, que nem sei se ainda existe (se alguém tiver alguma informação, avise-me por favor). Por conta disso, só nos restam os lagos e poços da cidade e arrededores. Praticantes de nautimodelismo se reúnem no Bosque da Barra, no Parque Guinle (Laranjeiras), no Campo S. Bento (Niterói), na piscina do CEFET (Maracanã), dentre outros lugares, mas falta no Rio uma associação organizada e disposta a divulgar o hobby.
No nautimodelismo motorizado (que também pode glow ou elétrico), existem 3 categorias básicas: os modelos em escala lentos, as lanchas rápidas e os veleiros.
Esses modelos lentos, como o meu Bristol Bay abaixo, reproduzem fielmente as embarcações reais e possuem navegação em velocidade de escala, isto é, são bastante lentos para tentar reproduzir, em escala, a velocidade com que seu representamen real navega. O meu modelo lento é um barco pesqueiro inglês da Baía de Bristol, fabricado pela Hobbico americana.
Esse modelo dispõe de um motor brushed, com escovas, um tipo de motor elétrico bem parecido com os motores de ventiladores e liquidificadores. Hoje, já existem os motores brushless, sem escovas que, por terem muito menos atrito, desperdiçam muito menos energia, são mais fortes e com mais empuxo, mas são usados, no Brasil, quase que exclusivamente no aeromodelismo elétrico. As baterias utilizadas são as NiCad (níquel-cádmio) ou NiMh (Níquel-metal-hidreto), resistentes e armazenadoras de bastante energia (as mais fracas que tenho são de 1500 mili ampères), mas pesadas demais. Por isso, os aeromodelistas usam as Lipo (Líon-polímero), mais leves, mas também mais perigosas. O barco possui ainda um servo, nada mais que uma engrenagem de acionamento eletromecânico que faz o leme virar para um lado e outro. Esse servo é ligado a um receptor, um dispositivo eletroeletrônico que dispõe de uma antena que capta os comandos do rádio-controle. No jargão modelista, o receptor é conhecido como Rx e o transmissor (o rádio), como Tx. O rádio do nautimodelismo pode ser o tipo stick ou pistola. O stick, abaixo, possui dois controladores que se movem em todas as direções, é o modelo de rádio usado no aeromodelismo. Cada direção de comando (cima-baixo / esquerda-direita) em cada stick é conhecida como canal. Um aeromodelo que se preze precisa de, no mínimo, 3 canais (explico melhor sobre isso quando escrever sobre aeromodelismo).
Aqui está o rádio do tipo stick:
O tipo pistola, por sua vez, é o que uso para esse modelo lento. Nesse caso, só preciso de dois canais, um para o acelerador (frente e ré) e outro para o leme (esquerda-direita). O gatilho da pistola é meu acelerador e o volante, meu controle de leme.
Veja mais detalhes do Bristol Bay:
A cabine de comando tem até um capitão, o imediato (esse de gravatinha e cap) e um marinheiro. Como é um navio pesqueiro, possui redes de pesca (feitas de rede de cabelo), tem bote salva-vidas, um mergulhador atrás, duas velas, cordas e todas as amarras necessárias. O navio é feito de madeira (casco) e fibra (convés). A hélice é feita de cobre. Possui ainda várias lanternas e luzes de navegação que, acessas à noite, o tornam quase uma árvore de natal flutuante.
Além do modelo em escala lento, existe também a categoria das lanchas rápidas, formada de lanchas, catamarãs, trimarãs, aerobarcos e afins. Minha lancha é uma Traxxas Blast, elétrica (claro), com uma velocidade razoavelmente alta.
As lanchas possuem, além do Rx, do servo e do motor, um outro dispositivo conhecido como Electronic Speed Control, ou ESC. Ele é responsável por traduzir os sinais do gatilho do Tx para o controle da velocidade. Em nautimodelos rápidos, a precisão do controle de velocidade é muito importante, assim como nos auto e aeromodelos. Um atraso de uma fração de segundo no comando pode significar a destruição total de um modelo. Ah, ali à direita da lancha, vocês podem ver um amontoado de baterias NiMh.
Por fim, o nautimodelismo à vela. Essa é, talvez, a categoria de nautimodelismo mais praticada no Brasil e no mundo. Os modelos à vela não possuem motor, portanto também não precisam de um ESC. Em compensação, possuem 2 servos, um para o comando do leme e outro, para o comando de vela. O servo do comando de vela, através de amarras reproduzidas exatamente como as dos veleiros reais, afrouxa ou aperta as velas para "caçar" o vento e fazer o veleiro sair do lugar. Para controlar um veleiro rádio-controlado, o modelista deve ter pelo menos uma noção de velas, dinâmica eólica, e noções de navegação. Lidar com esse tipo de modelismo é uma ótima maneira de aprender sobre navegação e passar a dominar o jargão técnico, desde termos simples como proa, popa, bombordo e boreste, até os mais "técnicos", como cunningham, boomjack, molinete, moitão, entre outros. O meu veleiro é da classe RG-65, possui 65 centímetros de vela, ideal para ventos moderados.
Essa peça na parte inferior do casco é uma quilha com um peso de chumbo que mantém a estabilidade do veleiro. Quando o vento está forte demais, é o que não permite que o barco vire.
Veja, finalmente, uma imagem da "casa das máquinas" do veleiro, com servos e links:
Essa "gosma" que reveste os servos é um lubrificante para evitar que o servo entre em contato com a água. De maneira geral, todo nautimodelo precisa ser muito bem impermeabilizado. Eu, por exemplo, "abrigo" as baterias (que, no caso do veleiro, são 4 pilhas AA comuns) e o Rx com vários balões de festa.
Além desses modelos, existe obviamente uma infinidade de variações - os navios de guerra com canhões que soltam água, réplicas rádio-controladas do Titanic, de vapores brasileiros, veleiros de quase 2 metros de altura, aerobarcos gigantes etc. Tudo depende do bolso do freguês e do entusiasmo pelo hobby.
De todas as modalidades de modelismo, eu considero o nautimodelismo a mais "tranquila". É ótimo levar meus modelos para um laguinho qualquer e ficar conversando com amigos, passando tempo enquanto os controlo pra lá e pra cá, faço manobras, passo por obstáculos etc.
Por fim, "tenho um filho de 8 anos, é aconselhável comprar um modelo desses?" A resposta é "infelizmente não". O modelismo é um hobby para adultos. Os modelos que compramos raramente vêm prontos para o uso, é preciso montá-los, soldar, entender de eletrônica e eletricidade (no caso dos modelos elétricos) e de mecânica (no caso dos modelos glow). A prática requer uma certa paciência (demora bastante até você ficar satisfeito com o navegar do seu nautimodelo ou com o planeio do seu aeromodelo), além de um certo treinamento, se você não quiser destruir modelos relativamente caros por bobeira. Para as crianças, existem os brinquedos de controle-remoto. Estes não podem ser considerados modelos, por conta da simplicidade de recursos eletrônicos e mecânicos, mas são uma ótima maneira de inciar a criança nesse hobby. Esses brinquedos são encontrados em lojas de brinquedos; os modelos profissionais, em lojas especializadas. Aqui no Rio recomendo a KnKhobby, a BigField e a Asas Elétricas.
É caro? Pode ser - ou não. Como eu disse, depende da qualidade do equipamento que você quer ter. Talvez o nautimodelismo seja, das modalidades de modelismo que pratico (aero, nauti, auto e ferreo), o mais barato. Geralmente, os equipamentos mais caros são os Tx. Os modelos em si não são tão caros. E lembre-se sempre que existem dezenas de fabricantes de peças eletrônicas e mecânicas, com os mais variados preços e qualidades.
Há também quem goste de construir seus próprios modelos, o que quase sempre fica mais barato, mas requer uma paciência de Jó. Um dia também escrevo sobre isso.
Surgiu interesse? Escreva-me um comentário que terei o maior prazer em auxiliá-lo. Estou em campanha para arregimentar novos nautimodelistas no Estado do Rio, para não deixar esse hobby tão sadio e instrutivo morrer ao léu.
Grande abraço,
Rafael Lanzetti