Wednesday, August 4, 2010

Fotos da Bolívia

Uma apresentação de fotos que resume nossa viagem à Bolívia.



Um abraço,
Lanzetti

Sunday, August 1, 2010

Bolívia - um país de altos e baixos



Trânsito caótico, dificuldade extrema de acesso, mal-estar por conta da altura absurda, informações turísticas erradas, desorganização, roubos e furtos a turistas. Por que alguém ia querer visitar um país desses?

Depois de quase 2 semanas na Bolívia, minha conclusão é a seguinte - é um masoquismo que, por lo menos una vez en la vida, vale a pena.

Muito resumidamente, relato aqui dicas para malucos como eu que desejam conhecer um dos países mais interessantes do mundo - seja por sua altitude, por sua cultura, ou por suas paisagens ímpares - e isso tudo aqui, tão perto de nós, e tão barato!

Para começar, há de se decidir como chegar à Bolívia - por vias terrestres ou aéreas. Minha dica - vá até Corumbá, MS e, de lá, atravesse a fronteira (aproveite para fazer umas comprinhas na Zona Franca de Puerto Quijarro, principalmente se precisar de casacos) para pegar o "Tren de la muerte".



Não se assuste com o nome - o "muerte" de "tren de la muerte" nada tem a ver com as condições da via férrea ou com a possibilidade de o trem cair de um desfiladeiro. Chama-se assim porque, no início do séc. XX, quando havia muita incidência de febre amarela na região, os corpos eram transportados em vagões desses trens, junto com porcos, galinhas e grãos, desenhando uma imagem certamente macabra para o forasteiro da época. Hoje, os trens são bem cuidados, limpos e "relativamente" rápidos.

Tarifas e horários aqui.

IPC (Importante Pra Caramba): tente comprar passagens de Ferrobus (cama ou semi-cama), o conforto vale a pena. Esses trens custam Bs. 222 (bolivianos, a moeda local. R$ 1 = Bs. 3,70 no câmbio de julho de 2010.), saem às 2as, 4as e 6as às 19h e chegam em Sta. Cruz de la Sierra na manhã seguinte, por volta de 9h. O "por volta de" deve ser bem reparado, pois, na Bolívia, atrasos e contingências pelo caminho ocorrem com frequência menstrual. Nosso trem ficou umas 2 horas parado no meio do caminho (por volta das 2 da manhã) para esperar um trem atrasado (sabe-se lá o porquê) que vinha em sentido contrário. Chegamos em Sta. Cruz às 11 da manhã.

IPC 2: Compre as passagens com 2 ou 3 dias de antecedência. Se você não tiver parentes em Corumbá ou região (meu caso, rá!), vai ter que dormir em Corumbá ou Puerto Quijarro por umas duas noites para conseguir comprar os famigerados bilhetes. Não compre na mão de cambistas (os bilhetes de Bs. 222 podem sair por Bs. 400), compre diretamente na estação.

IPC 3: No inverno, leve cobertores - o trem não possui calefação, aquecimento e que tais, se você não levar um cobertor, vai chegar com os pés congelados em Sta. Cruz (experiência própria).

IPC 4: Chegue na fronteira antes das 17h para registrar sua entrada na Bolívia. Para tanto, basta sua carteira de identidade brasileira com menos de 10 anos e em bom estado e - IMPORTANTE - comprovante de vacinação contra febre amarela. Este precisa ser o comprovante internacional. Para tanto, vacine-se em qualquer posto de saúde e, de posse do cartão nacional de vacinação, vá até um posto da ANVISA (você o encontra em quase todos os aeroportos) para receber o cartão internacional (azul) de vacinação. Yes... Se tudo estiver certinho, não precisará pagar nada na Oficina de Inmigración de Quijarro. Caso contrário, separe alguns dólares ou reais e tudo estará razoavelmente resolvido...

Na manhã seguinte, chegamos en la Terminal Bimodal de Sta. Cruz de la Sierra - um terminal híbrido de ônibus e trens (até os bolivianos são mais inteligentes que nós...), onde compramos logo as passagens de ônibus Sta. Cruz-La Paz para o mesmo dia às 17h30. Não há necessidade de se ficar em Sta. Cruz por mais de um dia, há pouco para se ver e a cidade não é tão interessante. É uma cidade grande, com altitude de 250 m acima do nível do mar, planejada em "anillos". O Centro é uma praça, 25 de agosto, que vai se alongando por dezenas de anéis até a periferia. Vale a pena percorrer uns 3 anéis a partir da praça, não mais que isso.





Às 17h e qualquer coisa, depois de passar um frio incomum em Sta. Cruz (até eles estavam assustados com a temperatura, não se falava outra coisa na TV), pegamos um ônibus da viação Copacabana com destino à La Paz, com chegada "prevista" (o termo sempre é esse) para as 8h do dia seguinte. Foi uma viagem mais confortável, com assentos do tipo leito, aquecimento etc. Duas paradas no meio do nada para banheiro e lanches (pra quem tem estômago para comer os lanchinhos deles). Já no caminho, prepare-se para começar a sentir os efeitos da poderosa altitude do Departamento de La Paz. Portanto,

IPC 5: Sorojchi Pills - você as encontra em qualquer farmácia boliviana (Bs. 3 a unidade) - são pílulas mágicas cuja composição química preferi não saber que ajudam muito a quem (como yo) sofre com os efeitos da altitude. Vale lembrar que a altitude de La Paz, 3600 m, não deve ser subjulgada. Qualquer esforço é multiplicado por 5, você respira e parece que não entra oxigênio, sente dores de cabeça, mal-estar, tontura, dentre outras coisas mais desagradáveis. Não seja "macho", tome as sorojchi e seja feliz! A venda en la farmacia más cercana de Ustd!

Chegando em La Paz no bonito Terminal Terrestre, tomamos um táxi até o hotel, na calle Sagárnaga, muito bem localizado, no centro turístico da cidade. Quanto aos táxis na Bolívia,

IPC 6: Não há taxímetros na Bolívia, o sistema deles é muito melhor e mais honesto que o nosso - antes de embarcar, você chega na janela do motorista e diz o seu destino acompanhado de "Cuánto dá?". O motorista diz o preço e você o aceita se quiser. A partir daí, pode haver engarrafamento, tumulto, rua fechada, o que for... você chegará em seu destino e pagará o combinado. Simples assim, sem enrolação com o turista. Quer uma dica? Use e abuse dos táxis, são rápidos e muito, muito baratos. Uma corrida de uma ponta a outra da cidade vai lhe custar uns Bs. 20, pouco mais de R$ 5. Uma regra que inventamos em La Paz (por conta das infindáveis ladeiras pra todo lado) foi "Bajar a pie, subir en táxi". Para entendê-lo, vamos ao

IPC 7: Para entender La Paz - a cidade é um buraco (literalmente) na Cordilheira dos Andes. Acima, a cidade periférica de El Alto, uma espécie de favela marrom (as casas não possuem reboco porque, assim, em "estado de interminável obra", pagam menos imposto) que permeia toda a cidade e pode ser vista de qualquer ponto do Centro, onde moram 2 milhões de pessoas de classe média baixa ou baixa, e onde a temperatura no inverno chega a ser 5 graus mais fria. Para vislumbrar La Paz, suba em qualquer ponto de El Alto e saque sua câmera de muitos megapixels. O resultado será mais ou menos este:




Em La Paz, há muito para se ver, e o ideal é separar uns 2 dias (se você for um andarilho intrépido como eu) ou até 4 (se for mais lerdo) para visitar os pontos interessantes. Destaque para a Calle Sagárnaga e entorno, com suas lojinhas de artesanato, o Mercado de las Brujas, onde se encontram, dentre outras coisas, fetos de lhamas para rituais macabros, chá de coca (bom para o estômago, para diminuir os efeitos da altitude); o museu da coca, a igreja de S. Francisco (com uma praça sempre movimentada), a Calle Jaén (com casas conservadas em estilo colonial e vários museus, com destaque para o museu de instrumentos musicais da Bolívia), a Plaza Murillo (centro administrativo do país, com o Palácio Presidencial, Catedral, Casa Legislativa), o Paseo El Prado (na principal avenida da cidade, um passeio de pedestres muito bonito, com restaurantes, sorveterias e cinemas), Plaza de los Estudiantes (no final do El Prado), Estádio Hernández Siles (só para imaginar como deve ser jogar bola nessa altitude), Sopocachi (um bairro de classe média-alta) e San Miguel (o bairro da elite pacenha, e, diga-se de passagem, que elite...).

Quanto mais baixo se vai em La Paz, mais ricos ficam os bairros, mais quente a temperatura, e menos seca a paisagem. Quanto ao frio invernal, prepare-se bem, com casacos grossos durante as manhãs e noites, e relaxe durante o dia, quando faz muito sol, e você chega a suar dentro de tanto casaco. O clima no inverno é muito seco, seus lábios racham, e você bebe muita água pra pouco xixi. No entanto, creio que o seja mesmo o inverno a melhor época do ano para se visitar o país, pois chove muito no verão, o que pode bloquear estradas e o próprio aeroporto.

Onde ficar: no entorno da Calle Sagárnaga há muitos hotéis e hostels com preços absurdamente baratos e razoavelmente confortáveis. Ficamos no Hotel Sagárnaga a US$ 25 a diária (quarto de casal) com um mínimo de conforto (banheiro privado e café da manhã). Mesmo os hotéis 5 estrelas não passam de US$ 150 a diária, embora eu continue achando que ficar em hotel 5 estrelas em La Paz seja bichisse.

Onde comer: novamente, no entorno da Calle Sagárna há muitas opções de restaurantes com preços para turistas (Bs. 40 [R$ 10] por uma lasagna de lhama, por exemplo). Para opções mais baratas ainda, há restaurantes no entorno da Plaza Murillo com almoço por Bs. 12 (salada, sopa, prato principal e sobremesa). Ainda mais baratos são os lanches (salchipapas, choripan, hamburguesas, panchos) nos podrões encontrados em quase toda esquina. A única ressalva é a higiene com que são preparados, mas... fuck yeah, estamos na Bolívia! O que não mata, engorda.

De La Paz, fizemos passeios através de uma agência de turismo anexa ao nosso hotel, a Diana Tours, mas, de certo modo, são todas la misma mierda - não te dão informações precisas sobre os passeios, os guias não são muito educados, os ônibus são ruins, muita gente... mas, novamente, estamos na Bolívia, vamos nos divertir! E são muito baratos, então, relaxe e goze.

Fomos primeiro às ruínas de Tihuanaco, civilização pré-inca que habitou a região do altiplano a uns 100 Km de La Paz. Não há muito o que se ver (pirâmide pela metade, restos de templos etc.), mas é interessante pela história e pelos museus com peças de cerâmica, crânios operados (sim, operações cerebrais no ano 1500 a.C.) e múmias.


No dia seguinte, fomos ao Chacaltaya, um dos picos da Cordillera Real de los Andes, com altitude de 5300 metros acima do nível do mar. A paisagem é magnífica, o frio e o vento, penetrantes; e a altura, assustadora. São muitíssimo poucos os lugares no mundo onde se pode chegar a essa altitude sem precisar escalar. Chacaltaya é uma experiência que vale a pena ser vivida. É quase como chegar no topo do mundo.




Para se chegar lá, o ônibus sem muita estabilidade serpenteia uma estradinha indecentemente perigosa pelo meio dos andes, passando por um dos 5 laboratórios de física cósmica do continente, até quase o topo da montanha. Da estação aquecida, são mais 300 metros a pé até o cume - não é pra qualquer um...

No mesmo dia, numa manobra infeliz do guia de turismo, fomos até o outro extremo da cidade de La Paz (o ponto mais baixo da cidade) - o Valle de la Luna, um vale de formações rochosas interessantes. É bonito, diferente, mas muito cansativo... Segue-se por uma trilha de 45 minutos de degraus e rampas para se avistar todo o vale. Depois de subir a 5300 m, isso dá uma dor de cabeça...



No dia seguinte, partimos para o nosso passeio de 3 dias ao Titicaca, o lago mais alto do mundo, a 4000 m de altura acima do nível do mar - os peixes desse lago gélido ganharam o meu mais profundo respeito.

A paisagem é deslumbrante, a água, límpida (pelo menos do lado boliviano). Fomos de ônibus (2 horas desde La Paz) até uma ponta do lago (San Pedro de Tiquina), onde é preciso sair do ônibus, pegar uma lancha e atravessar por 5 minutos um braço do lago. O ônibus vai numa balsa separada. Vale pela parada e pelas fotos.




Em seguida, mais 45 minutos até Copacabana, uma simpática cidadezinha de onde partem os passeios à Isla del Sol e à Isla de la Luna, dois lugares dos mais bonitos do mundo para se tirar fotos. Mas... como tudo na Bolívia, a boa foto requer um esforço descomunal de subir centenas de degraus até o topo das ilhas. De lá, povoados perdidos no tempo, as tradicionais "cholas" (mulheres com trajes tradicionais bolivianos), lhamas, ovelhas, ruínas de palacetes incas e a visão do lago e da Cordilheira. O esforço definitivamente vale a pena.





No dia seguinte, partimos rumo a Puno, no Perú. São 40 minutos até a fronteira Bolívia-Perú, às margens do lago, onde precisamos descer do ônibus, passar pela emigração boliviana, pela imigração peruana, trocar Bolivianos por Soles (R$ 1 = S/ 1,60) e tomar uma água. Uns 30 minutos depois, continuamos por 3 horas até Puno, uma cidade bem maior que Copacabana, capital do Departamento de Puno, com boa infraestrutura turística, praças muito bonitas e limpas, feiras caóticas onde se vende de tudo (incluindo ovelhas vivas amarradas pelas patas deitadas no chão e berrando) e um porto de onde partem os passeios às ilhas flutuantes. No Perú, as coisas são mais caras que na Bolívia, mas ainda baratas para os brasileiros. Uma refeição para duas pessoas num bom restaurante sai por S/40, cerca de R$ 25,00. Qualquer almoço em shopping no Brasil dá mais que isso. O hotel em que ficamos (Sillustani) foi o melhor hotel da viagem, com aquecedor, ducha quente com pressão, wireless, ótimo desayuno e custou meros US$ 30.



Partimos então para as ilhas Uros, ilhas flutuantes onde vivem de 5 a 7 famílias (são ao todo mais de 80 ilhas) feitas de totora, uma planta aquática que lhes serve de abrigo, comida, ferramenta e meio de transporte (há muitos barcos feitos de totora). É um passeio de 3 horas interessantíssimo, embora a insistência dos nativos para que compremos suas bugigangas dê um pouco no saco. Chegando às ilhas, um dos nativos explica como são construídas ilhas e casas, como vivem etc. Em seguida, entramos numa das casas e conhecemos a família, para a partir daí perambularmos sobre a totora para imaginar como seria viver exclusivamente em cima de um treco daqueles. Por conta da humidade, por exemplo, vários deles sofrem de reumatismo crônico, para não entrar em mais detalhes.


Voltando a La Paz, depois de baldeação em Copacabana e 8 horas de viagem, percorremos a cidade por mais dois dias, tomamos helados no Brosso (ótima heladería no Prado), fomos à feira de El Alto (aos domingos, lotada de gente, onde demos uma "turistada" e levamos uma câmera para filmar a confusão. Numa ação fulminante e profissional, 3 vagabundos me puxaram a câmera do bolso e saíram correndo. A câmera em si custou US$ 100, mas, como era o último dia, todas as filmagens feitas pela Cynthia se foram...).

Impressões finais

Os bolivianos - povo trabalhador (exceto os vagabundos que levaram a nossa câmera), que abre seu comércio às 8h e só fecha depois das 20h (não há siesta na Bolívia), inclusive aos sábados e domingos. São educados com os turistas (sabem que 50% de sua economia depende do turismo), e pareceram-me ordeiros (as praças de La Paz são muito mais limpas que qualquer praça do Rio ou São Paulo).

O país - é um país pobre, liderado por um presidente populista (sr. Evo Morales), dos que perpetuam a miséria através de incentivos sociais paliativos, com muitos problemas estruturais (em pouco tempo, o país vai ficar sem água, pois dependem do degelo da Cordilheira, que, como vocês viram nas fotos, já não possuem quase nenhum gelo), com sérios problemas de educação, analfabetismo, higiene, dentre outros. No entanto, possui uma cultura tihuanacota e inca riquíssima, com música e tradições bem características, paisagens belíssimas, todo tipo de clima e altitude (não se esqueçam de que o território boliviano começa no nível do mar com o Pantanal e parte da Amazônia e vai até 5300 m com clima árido e frio), etnias diferentes e comida exótica (pra ser educado).

A viagem - cansativa, sofrida, looonga, difícil. É uma viagem para turistas profissionais, os que sabem se virar, falam espanhol (pelo menos se viram na língua), não têm muitas frescuras, conseguem abstrair a falta de conforto e divertir-se apesar disso. Para o nosso perfil, valeu muito a pena, foi uma experiência inesquecível e enriquecedora. Talvez não voltemos mais à Bolívia (o mundo ainda tem muito lugar interessante...), mas faríamos novamente tudo o que fizemos.

Vocês não foram ao Salar de Uyuni, a outras cidades?
Não, e pelos relatos de pessoas que encontramos em La Paz que haviam feito esses passeios, ficamos contentes de ter tomado essa decisão.

Por fim, se alguém quiser tirar alguma dúvida, fique à vontade para nos contactar.

Boa viagem e boa sorte aos malucos que resolverem visitar esse país tão perto e, ao mesmo tempo, tão distante de nós.

Grande abraço,
Cynthia e Rafael